Os pacientes em tratamento de câncer no Brasil possuem muitos direitos assegurados por leis e normas. Você sabe quais são todos os seus direitos?
É comum que o plano de saúde negue a cobertura de certos procedimentos indevidamente, atrasando o tratamento, causando um estresse em um momento muitíssimo deliciado e até mesmo fazendo que o paciente tenha que pagar de seu próprio bolso o tratamento ou buscar a rede pública.
Para evitar que situações como essas sejam recorrentes, preparamos este texto para deixar claros quais são estes direitos.
Para tanto, abordaremos os tipos de planos de saúde, a cobertura obrigatória e seus desdobramentos, a negativa da operadora em cobrir o tratamento oncológico e como proceder diante dela.
Cobertura obrigatória do tratamento de câncer
O câncer é uma doença de cobertura obrigatória nos planos de saúde. Essa cobertura, porém, é feita nos limites do plano contratado. Ao escolher um plano, o beneficiário define sua abrangência, que pode incluir consultas, exames, internações e outros. Veja a diferença:
- Plano ambulatorial: consultas médicas, exames e procedimentos sem internação;
- Plano hospitalar: envolve apenas a internação e os procedimentos realizados durante referido período. Pode ter cobertura obstétrica ou não.
Prescrição médica de tratamento
Os procedimentos, exames e tratamentos de saúde com cobertura obrigatória pelos planos de saúde estão previstos no chamado Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde, definida pela Agência Nacional de Saúde Suplementar. Ele é válido para todos os planos de saúde, mesmo os chamados antigos, contratados antes de 1999.
A partir do momento em que o médico especialista prescreve um tratamento ou procedimento para determinada doença coberta pelo plano de saúde, ele deverá ser fornecido pelo plano, mesmo que não esteja no rol da ANS.
Em outras palavras, a decisão do tratamento ou exame cabe exclusivamente ao médico, e não ao plano de saúde. Sendo o câncer doença de cobertura obrigatória, não pode haver qualquer tipo de exclusão de tratamento no contrato.
Se houver pedido médico, a cobertura do tratamento é obrigatória.
É o que dizem as Súmulas 96 e 102 do Tribunal de Justiça de São Paulo:
Súmula 96 TJSP: Havendo expressa indicação médica de exames associados a enfermidade coberta pelo contrato, não prevalece a negativa de cobertura do procedimento.
Súmula 102 TJSP: Havendo expressa indicação médica, é abusiva a negativa de cobertura de custeio de tratamento sob o argumento da sua natureza experimental ou por não estar previsto no rol de procedimentos da ANS
Alguns exemplos de tratamentos cobertos
Conforme apresentado anteriormente, como o câncer é doença de cobertura obrigatória, se houver pedido médico, todos os tratamentos são devidos.
Como exemplos, podemos citar, de acordo com o tipo de plano:
- Fornecimento de medicamentos de uso domiciliar;
- Sessões de quimioterapia ou radioterapia ambulatoriais (sem internação), em casos de planos ambulatoriais;
- Realização de exames para acompanhamento e evolução de internação anterior em casos de planos hospitalares;
- Cirurgia plástica reconstrutiva da mama pós cirurgia de mastectomia.
Sobre o fornecimento de medicamentos de uso domiciliar, vale lembrar a norma editada pela ANS em 2014. A Agência editou uma resolução que obriga as operadoras de planos de saúde a fornecer aos pacientes com câncer medicamentos para controle dos efeitos colaterais e adjuvantes relacionados ao tratamento quimioterápico oral ou venoso.
A Resolução Normativa 349 obrigou a distribuição de oito grupos de medicamentos, de uso domiciliar, para tratar os efeitos colaterais, com as devidas diretrizes de utilização. Agora, o tratamento oral para efeitos colaterais, que já era feito em hospitais e clínicas, poderá ser feito em casa.
Por fim, é importante destacar que, no caso de o tratamento não estar disponível na rede credenciada do plano de saúde, a operadora deve assumir o custeio perante clínica, médico ou laboratório particular ou efetuar o reembolso integral do valor gasto pelo paciente.
A negativa do plano de saúde em cobrir um tratamento de câncer
Os planos de saúde, diante de determinados procedimentos prescritos pelo médico, se negam a prestar devidamente os serviços ao qual estão obrigados.
Os argumentos mais comuns utilizados são tratamento experimental, exclusão contratual, procedimento não previsto no rol da ANS, doença preexistente e carência.
Tratamento experimental
Tratamento experimental que já tem sua eficácia comprovada e foi prescrito pelo médico tem cobertura obrigatória. O que acontece é que nem o plano de saúde nem a ANS tem a agilidade para acompanhar o avanço científico e o rol de medicamentos aprovados fica sempre desatualizado.
Porém, ainda que seja dito experimental pelo plano de saúde, o tratamento deve ser concedido pelo plano sempre que se referir a uma doença coberta pela plano, desde que haja prescrição médica.
Exclusão contratual
Os planos de saúde regulamentados pela Lei nº 9.656/98 obedecem à regra anteriormente dita: se há cobertura da doença e há prescrição médica, o tratamento indicado pelo profissional deve ser custeado. Nesse caso, a alegação de exclusão contratual do procedimento não é válida.
Se o médico prescreve, por exemplo, o exame de PET/SCAN, e o beneficiário tiver plano ambulatorial, tem direito à cobertura. O mesmo acontece quando prescreve um medicamento importado.
Qualquer cláusula do contrato que exclua tratamentos de câncer é nula, uma vez que a doença tem cobertura obrigatória.
É preciso destacar que a relação entre plano de saúde e paciente é de consumo, e, portanto, subordinada às normas do Código de Defesa do Consumidor. De acordo com a lei, ainda que o plano de saúde tenha em seu contrato cláusulas que o exima da responsabilidade de fornecer tratamento prescrito, elas não terão validade em alguns casos.
Isso porque “são nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade”, como escrito no Art. 51, IV.
Procedimento não previsto no rol da ANS
Conforme exposto anteriormente, o plano de saúde só pode definir em contrato quais as doenças farão parte de sua cobertura. Ele não pode delimitar os tratamentos!
Como o câncer é uma doença de cobertura obrigatória, se o médico especialista definiu um tratamento específico que não está no rol da ANS, ele deverá ser fornecido pelo plano. É o que dizem as súmulas 96 e 102 do TJSP expostas mais acima.
Doença preexistente
Doença ou lesão preexistente é aquela “que o beneficiário ou seu representante legal saiba ser portador ou sofredor no momento da contratação ou adesão ao plano privado de assistência à saúde”.
A carência estabelecida pela ANS no caso de lesão ou doença preexistente é de 2 anos, em regra.
Se não foi feito exame admissional pelo plano de saúde constatando a doença no momento da adesão e o segurado não sabia que tinha a doença, ela não pode ser tida como preexistente e a cobertura é obrigatória.
Esse entendimento é inclusive sumulado (de tantas vezes que foi julgado) pelo Tribunal de Justiça de São Paulo:
Súmula 105 TJSP: Não prevalece a negativa de cobertura às doenças e às lesões preexistentes se, à época da contratação de plano de saúde, não se exigiu prévio exame médico admissional.
Ainda, a operadora não pode negar a venda de um plano de saúde a uma pessoa que tenha doença ou lesão preexistente, que demande um tratamento de alto valor.
A venda é obrigatória e, no máximo, o plano pode aplicar a carência de 2 anos.
Carência
Carência é o período que o beneficiário deve esperar para começar a usar o plano de saúde. O beneficiário que não possui doença preexistente está sujeito aos prazos previstos no site da ANS que são de no máximo 180 dias.
Porém, o plano não pode alegar tal carência em situações de urgência ou emergência, cujo prazo é de apenas 24 horas. Clique no link para saber mais.
(Veja outros direitos que você não sabia que tinha, com indenizações de R$ 5 mil a R$ 10 mil)
O que fazer diante da negativa do plano de saúde ao tratamento de câncer?
Conforme orientação da ANS, se o plano de saúde se negar a oferecer o tratamento, o paciente deve, em primeiro lugar, entrar em contato com o plano. É importante anotar os números de protocolo e mandar e-mails, como meios de prova.
Se a operadora mantiver sua negativa, o consumidor deve denunciá-la para a Agência Nacional de Saúde, por telefone, pelo site ou por um dos núcleos da agência presentes nas principais capitais brasileiras. Preferencialmente, o órgão instrui o contato por meio do Disque ANS, no número 0800-7019656.
A Agência é responsável por multar as operadoras e suspender a atuação daquelas que não cumprem suas normas. Mas nem sempre consegue ser eficaz com essas medidas, motivo pelo qual o paciente pode ingressar na Justiça.
Ação judicial com pedido liminar
A liminar é uma espécie de ação de cumprimento imediato, que obrigará a realização do procedimento pelo plano de saúde. Se o beneficiário dispuser de todos os documentos necessários, a decisão sai no mesmo dia. Veja os documentos:
- Cópia do RG e CPF ou Carteira de Motorista;
- Endereço com CEP;
- Estado civil e profissão;
- Cópia da carteirinha do plano de saúde;
- Cópia do pedido médico;
- Cópia da negativa do plano de saúde (se tiver).
Muitos pacientes, em um momento de aflição, dispendem recursos próprios para custear seu tratamento. No tratamento de câncer, os valores de determinados procedimentos são altíssimos, e podem levar o beneficiário a situações extremas para se tratar.
Por isso, o ideal é procurar um advogado especializado para entrar com a ação com pedido liminar antes de realizar o procedimento, para que o consumidor não desembolse seu próprio dinheiro. Em alguns casos, a ação pode se cumular com pedido de indenização por danos morais.
A negativa abusiva e o dano moral
Negativa abusiva de tratamento é a situação em que o plano de saúde deixa de cobrir um procedimento prescrito pelo médico, alegando exclusão contratual, carência ou tratamento experimental e outros.
Porém, o entendimento dos tribunais brasileiros, dentre eles o Superior Tribunal de Justiça – STJ, de Brasília, diz que “se o contrato prevê a cobertura de determinada doença, é abusiva a cláusula que exclui o tratamento, medicamento ou procedimentos necessários à preservação ou recuperação da saúde ou da vida do contratante”.
A negativa injustificada das operadoras para o tratamento de câncer implica em desgaste psicológico que ultrapassa o mero aborrecimento, o que autoriza a indenização por danos morais. Os danos morais existem quando uma pessoa é exposta a uma situação ofensiva à sua honra, sua dignidade e sua reputação, que causa abalos psicológicos.
A jurisprudência dos tribunais (posição consolidada sobre determinado tema) alega que o plano de saúde é um fornecedor de serviços responsável, independentemente da existência de culpa, por reparar os danos causados ao consumidor por defeitos relativos à prestação de serviços.
Os casos mais graves de indenização por danos morais se relacionam exatamente ao câncer. Nos tratamentos da doença, uma negativa de cobertura pode atrasar uma aplicação de quimioterapia, uma cirurgia ou a realização de um exame relacionado ao tratamento.
Há claro prejuízo à saúde, uma vez que a situação coloca a vida do paciente em risco. Diante disso, os tribunais têm condenado os planos de saúde a indenizar pacientes de câncer que tiveram o tratamento ou diagnóstico atrasado ou interrompido por danos morais em valor altíssimos, que podem chegar entre R$ 40 mil e até R$ 60 mil, dependendo da gravidade do caso.
Foi o caso da condenação do Bradesco Saúde, que cobrou indevidamente a paciente pelo tratamento oncológico fornecido no Hospital Albert Einstein. Nesse caso, a seguradora foi condenada ao pagamento de R$ 12 mil por danos morais e ao reembolso de todas as despesas médicas.
Clique aqui para ver outras condenações de planos de saúde em casos de câncer.
A importância de um profissional especializado
Para garantir que o paciente tenha acesso ao tratamento necessário para o câncer, diante da negativa de resolução pelo plano e da não resolução pela ANS, é recomendado procurar um advogado especialista em direito de saúdepara ingressar com a ação com pedido liminar.
O profissional especializado é fundamental para que o paciente tenha o amparo devido. Ele aumenta as chances de sucesso na ação, já que ele tem mais domínio sobre o posicionamento dos tribunais e o tema, por conhecer a legislação e já estar ambientado com o assunto.
Para o especialista, que já entende os fundamentos da negativa abusiva e da cobertura obrigatória, ingressar com o pedido liminar para garantir o tratamento é uma postura basicamente automática. Isso acontece devido à vasta experiência no assunto.
Quando alguém procura um advogado sem especialização, principalmente no caso de tratamentos de câncer, que podem comprometer gravemente a saúde, está sujeito à demora e a erros.
A saúde de uma pessoa é um bem de valor inestimável e, para cuidar dela, o paciente deve saber todos os seus direitos em relação ao plano de saúde. No tratamento de câncer, isso se torna ainda mais evidente, uma vez que é comum a negativa do plano de saúde a certos procedimentos.
Nesses casos, é importante contar com a ajuda de um profissional especializado para fazer valer seus direitos como paciente e consumidor.
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Advogado inscrito na OAB/SP
Diretor-adjunto da Comissão de Direito Administrativo – OAB/SP
Membro da Comissão de Direito Urbanístico – OAB/SP
Membro do IBRADEMP (2012/2013)
Direito Tributário – Fundação Getúlio Vargas – FGV/SP
Vice-Presidente da Associação Brasileira de Defesa dos Desapropriados
Master in Business Management – Fundação Getúlio Vargas – FGV/SP
Entrepreneurship Program – Babson College, Boston, Estados Unidos
Escritor no blog Transformação Digital
Vencedor do prêmio ANCEC – Referência Nacional pela Inovação no Atendimento Online e Rápido
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